Ciberdependência
Arthur Prado-Netto
Ainda não há um consenso acerca desse tema. Alguns estudiosos consideram a ciberdependência como um vício comportamental, enquanto outros a veem como um sintoma da depressão, fobia social ou Transtorno Déficit de Atenção (TDAH).
Os ciberadictos apresentam uma necessidade excessiva de usar a Internet. Essa necessidade pode ser expressa de diferentes formas, sendo ao jogar de videogames, utilizar redes sociais ou consumir conteúdo pornográfico de forma excessiva.
O vício cibernético aparece principalmente na adolescência, raramente antes. Ele atinge principalmente meninos, que tendem a ser grandes consumidores de jogos online. Esses jogos têm possibilidades infinitas de expansão e permitem que a criança interaja com outros jogadores que estão online ao mesmo tempo, podendo estender-se por um período extremamente longo. Assim como o vício em um produto, o ciberadicto irá gradualmente se desligar de outros centros de interesse, como atividades ao ar livre, amigos e família. Falamos em vício cibernético quando este passatempo invade o dia a dia da criança com risco de abandono escolar, isolamento social e abandono de outras atividades.
Na pandemia, o vício pelas telas aumentou. O próprio sistema de aulas remotas colaborou de certa forma no aumento de tempo de exposição as telas digitais. Embora a aprendizagem remota tenha proporcionado certa continuidade educativa durante a pandemia, também tem sido criticada pelos profissionais da saúde por manter as crianças coladas às telas durante muito tempo.
Michael Stora foi um dos primeiros psicólogos franceses a se interessar pelo digital, tanto como objeto de pesquisa quanto como ferramenta terapêutica. Escritor, professor, consultor e jogador apaixonado, ele fundou o Observatório de Mundos Digitais em Humanidades em 2000 e se especializou em vício em videogames.
Segundo Stora (2021) o jovem deixa tudo para se dedicar ao jogo. A relação com os videogames se torna semelhante a outros vícios. O jogo torna-se mais importante que outros temas sociais. As relações virtuais são maiores que a ligação com o mundo real. E se a pessoa não conseguir ultrapassar esta forma de funcionamento em seis meses, pode-se dizer que se trata de um quadro diagnóstico de Ciberdependência.
De acordo com Stora, 98% dos jovens que sofrem de ciberdependência têm um QI elevado, mas também apresentam, frequentemente, fobias sociais ou alguma forma de autismo. Para eles, os jogos digitais tornam-se uma espécie de antidepressivos interativos.
Você sabia que o Brasil é campeão no mundo de uso de Smartphone por dia?
O uso de smartphones e tablets aumentou quase 50% nos últimos dois anos devido à pandemia. Na maior parte do tempo, usuários estão utilizando seus dispositivos para acessar algum tipo de aplicativo, seja uma rede social, ou até mesmo algum jogo online.
Passamos em média cinco horas e meia por dia em nossos celulares, conforme mostra uma pesquisa realizada em 2021. Demorou apenas quinze anos para que esse aparelho se tornasse nosso “melhor amigo”, ou dependendo do ponto de vista adotado, uma prótese da qual dificilmente podemos nos livrar.
Por que há claramente um mal-estar? Basta olhar para o sucesso dos programas de desintoxicação digital que se tornaram um fenômeno da moda: algumas pessoas, de forma voluntária e consciente, optam por não usar um telefone celular (ou qualquer outro aparelho conectado à internet) por um determinado período. Estudos já evidenciam que o uso constante e contínuo das telas e, consequentemente, das redes sociais está diretamente ligado a uma crescente dificuldade de concentração.
Em 2015, Edson Tandoc, professor de comunicação da Nanyang Technological University em Cingapura, e seus colegas mostraram que, entre os jovens, o uso pesado do Facebook estava associado a sintomas depressivos. Isso acontece porque as pessoas tendem a se comparar constantemente com o que veem online, alimentando uma vontade de viver a vida maravilhosa do instagram, com filtro, boca avermelhada e pele plastificada, como nos desenhos animados.
Recentemente, procuradores-gerais de 44 estados da América escreveram ao fundador do Facebook, Mark Zuckerberg, para compartilhar com ele os resultados de várias pesquisas que destacam a ligação entre o uso do Instagram e um aumento da depressão e suicídio na população mais jovem. A discussão aborda, também, o efeito tóxico da uma comparação recorrente entre jovens de mesma idade (em particular graças a um filtro conhecido como “cirurgia estética” para retocar suas fotos), que vem resultando em transtornos alimentares e transtorno da imagem do corpo.
MÖHRING-GEISLER (2021) postula que o vício em videogames (internet gaming disorder) foi incluído no anexo de pesquisa do DSM-5: os especialistas consideram, portanto, que a pesquisa ainda é insuficiente para definir o vício em videogames – na Internet – como um transtorno real, mas o configura enquanto uma das patologias que requer mais estudos científicos. Portanto, embora não se deva declarar precipitadamente que várias horas de uso diário do telefone celular seja patológico, é melhor manter um olhar atento.
Referências:
Junier H, Olano M (2017)
Pinna M (2021)
Möhring-Geisler (2021)
Stora M (2021)